Como as ferramentas de privicidade dos navegadores web impactam no desenvolvimento de ações do Marketing Digital?
As ferramentas de controle de privacidade e de exibição de conteúdo que podem ser adicionadas aos navegadores deram aos utilizadores poder para definir o que veem e quais dados podem ser enviados aos sistemas monitoramento de atividades. Por outro lado, estes recursos impactam sensivelmente as ações de marketing. Este artigo discute o impacto da adoção desses recursos por parte dos utilizadores.
Resumo
A gestão do conhecimento relacionada às tecnologias aplicadas ao Marketing enseja o uso de diversos tipos de dados obtidos no ambiente digital e posteriormente transformados em informações sobre os clientes da organização a partir de uso de softwares especializados. A aquisição destas informações permite às empresas a formação de uma base de conhecimento imprescindível para as ações de marketing digital, sobretudo das organizações que atuem no ambiente web. As informações acerca do comportamento dos usuários nos ambientes on-line permitem indicar seus interesses, objetivos de busca e interação e por isto tornaram-se insumos indispensáveis para o desenvolvimento e aplicação de ações de marketing, sobretudo no que diz respeito à publicidade e ao mercado de vendas digitais (e-commerce). De posse dessas informações as empresas tornam-se capazes de elaborar estratégias e ações de marketing pautadas no perfil do usuário. O marketing, como atividade relativa ao mercado, necessita e faz uso constante de informações que permitem definir estratégias relacionadas a ações de publicidade digital e de exibição de material de anunciantes diversos. Isto ocorre com base na obtenção de dados dos usuários durante suas interações com sistemas e sites da internet, através da identificação de informações demográficas, interesses de busca, tempo de permanência em páginas web, dentre outras. Recentemente, diversas ferramentas e recursos digitais, como softwares e aplicativos para navegadores web, capazes de controlar a informação que o usuário compartilha durante a navegação por websites e sistemas on-line na internet tornaram-se facilmente disponíveis. Estas ferramentas colocaram à disposição daqueles que acessam websites, recursos capazes de lhes fazer controlar os dados que eles próprios compartilham de forma involuntária durante o processo de navegação pela rede. E assim, passa a ocorrer um maior do controle dos dados que são disponibilizados aos sistemas de marketing capazes de realizar a análise de comportamento e perfil daqueles que navegam pela internet. É inegável a importância da informação para as organizações como um diferencial competitivo e sobretudo, às ações de marketing que podem ser significativamente afetadas pela redução ou indisponibilidade de dados e informações acerca de seus clientes. O surgimento de ferramentas de privacidade permitiu aos usuários da internet, durante o processo de navegação em websites e sistemas digitais exercerem certo nível de controle sobre a coleta dos dados e sobre os rastros armazenados em sistemas de informação a respeito do seu processo navegação e de suas escolhas em ambientes digitais. Este artigo busca traçar um panorama atual das tecnologias utilizadas pelos usuários para controle de privacidade e do impacto da adoção destas novas formas de controle sobre a gestão do conhecimento do cliente para as organizações e para o marketing.
Palavras-chaves
Gestão do Conhecimento, Marketing, Gestão do Conhecimento do cliente, Tracking Data Collection, Ferramentas de Privacidade
INTRODUÇÃO
A informação tornou-se um ativo de suma importância para as organizações. De acordo com Rai (2004), as organizações que buscam uma posição diferenciada de mercado necessitam acompanhar estreitamente o ambiente interno e externo para que as tomadas de decisões estratégicas ocorram de forma bem-sucedida. De acordo com CHOU 2003, fatores como ambiente externo, tecnologia e regulamentações políticas, demanda de consumo e competição são fatores que afetam o processo de tomada de decisões das organizações. Observa-se no contexto atual o surgimento de fatores preponderantes capazes de definir rapidamente o sucesso ou fracasso de ações das organizações, inclusive aqueles advindas de departamentos ou setores especializados, como por exemplo, o Marketing. As ações de marketing, especificamente aquelas voltadas para o ambiente digital, frequentemente denominadas ações de marketing digital são especialmente impactadas por cenários que até então não existiam no ambiente organizacional, como por exemplo: novos ciclos de vida de produtos, diminuição do tempo necessário para implementar inovações, atenção reforçada ao usuário e aspectos de usabilidade, busca constante por relevância em produtos e soluções e fatores externos advindos de organizações competidoras e de regulações governamentais.
Este cenário culminou no que vêm sendo chamado como era da informação ou sociedade informacional em que a informação passou a exercer um novo tipo de poder (Jeanneret, 2008). Aquele que detém a propriedade dos estoques informacionais é que determina e condiciona a produção de novos tipos de conhecimento (Barreto, 1999). A informação passou a ser um subsídio fundamental capaz de permitir a rápida alteração dos cenários competitivos em que as organizações se encontram inseridas. A ações de marketing desempenhadas pelas empresas passaram a refletir no mercado em tempos significativamente menores e o sucesso ou insucesso destas está consideravelmente relacionado com a disponibilidade de dados e informações. De acordo com Porter (1986) a disponibilidade e o acesso à informação pode ser um fator de diferenciação competitiva extremamente valioso para as organizações. Atualmente, empresas e especificamente departamentos internos especializados em lidar com a informação e gerar competividade, como o departamento de marketing, por exemplo, fazem uso de uma gama singular de softwares e ferramentas capazes de gerar análises de mercado, de concorrência, de prospects, leads e clientes e assim gerar diferencial competitivo para a organização.
Atualmente, observa-se o surgimento de um tipo de dado obtido a partir do uso de softwares e ferramentas de marketing. Estes dados são coletados a partir do acompanhamento das atividades e ações em websites e sistemas on-line de usuários durante suas atividades de navegação e pesquisa. Este tipo de obtenção de dados é denominado tracking (do inglês – seguir, acompanhar, “trackear”), normalmente mencionado na área de tecnologia como “traqueamento”. Através do uso de scripts (normalmente, em linguagem de programação java script), informações sobre a navegação de usuários em websites, suas ações, suas escolhas e práticas recorrentes são acompanhadas por softwares capazes de traçar um perfil de acesso, inclusive a partir da coleta de dados demográficos, como por exemplo, idade do usuário, local de acesso, além de interesses por produtos, assuntos e eventuais escolhas destes usuários dentro do ambiente digital. Estas novas formas de obtenção e coleta de dados e informações trazidas pelo advento de plataformas e ferramentas inovadoras fundamentadas pela evolução da tecnologia e propriamente da web e de suas aplicações colocam nas mãos dos responsáveis pelos departamentos de marketing das organizações um volume extraordinário de dados e informações capazes de gerar um diferencial competitivo significativo para a empresa.
1 - Gestão do Conhecimento e Marketing
O conceito de Gestão do Conhecimento começa a ser discutido a partir do início do ano de 1990. De acordo com SVEIBY (1998, p. 3), “a Gestão do Conhecimento não é mais uma moda de eficiência operacional”. Faz parte da estratégia empresarial. A Gestão do Conhecimento é um processo sistematizado de reconhecimento, renovação, geração e utilização do conhecimento de forma estratégica na organização. Proporciona à organização saber o que ela sabe para que de forma efetiva ela se torne capaz de obter vantagem competitiva. DRUCKER (1999) menciona que o trabalho se torna cada vez mais fundamentado no conhecimento. Essa é uma das questões mais centrais das organizações contemporâneas, afetando diretamente as áreas de marketing, em que se tem verificado progressivamente inquietações relativas à obtenção de dados, informações e geração de conhecimento e explicitação de conhecimento comunicável capaz de gerar diferencial competitivo e o potencial inovador da organização.
Para Kotler (2000, p. 30) o marketing é definido como “um processo social e gerencial pelo qual indivíduos e grupos obtêm o que necessitam e desejam através da criação, oferta e troca de produtos de valor com outros”. O marketing é uma atividade humana essencialmente ligada ao conhecimento relacionado às ações e práticas tecnológicas relacionadas às capacidades de troca orientadas para a satisfação de necessidades e desejos dos clientes. A informação é um recurso essencial para a prática do marketing e as atividades a ele relacionadas. A criação de novos produtos e serviços, os processos de segmentação, as escolhas de estratégias de mercado, o estreitamento do relacionamento com clientes e prospects e a própria capacidade de consumo e obtenção de informação para a geração de conhecimento sobre o cliente são dependentes diretos da disponibilidade de informação.
De acordo com (IZBERK-BILGIN, 2010) o campo do marketing como aplicação da mercadologia atua diretamente na concepção da cultura do ocidente orientada ao consumo. O campo do marketing inter-relaciona-se com outras áreas das ciências e campos de tecnologias aplicadas de forma interdisciplinar articulando processo teóricos e práticos com o objetivo de potencializar atividades de mercado que resultam em consumo, estreitamente relacionado à aspectos de satisfação, valorização e utilidade. Os novos ambientes de consumo mediados pelas tecnologias que favorecem interações à distância passam a atuar como suporte impreterível para as ações do campo do marketing e a aplicação tecnológica de seus recursos com vistas a alcançar os diferenciais de competitividade e inovação tão almejados pelas organizações inseridas na era da informação.
As relações básicas de troca de produtos e serviços que em geral se dão como processo de compra e venda são objetivo de estudo do marketing. Ou seja, este como campo de aplicação, busca entender e situar a relação ocorrida dentro do universo concebido e demarcado conceitualmente como mercado e seu contexto de atuação é especialmente externo. As relações inerentes a este universo são mediadas por elementos tangíveis como preços, pontos de vendas, embalagens, comunicações, folhetos, dentre outros recursos materiais. Entretanto, em grande parte, são também verificados aspectos relacionais com alto grau de intangibilidade pautados em mídias e ferramentas digitais como lojas virtuais, sites, portais, blogs, vídeos, redes sociais, sistema de rastreamento, sistemas de marketing e de remarketing e a própria marca da organização. A informação passa portanto, a ser uma aplicação em sistemas e artefatos digitais com funcionalidades e capacidades comunicativas que facilitam a promoção, o controle e o acesso à distância, facilitando a geração de bases de conhecimentos para a organização e os setores de marketing, especialmente.
2 - A importância da disponibilidade de informações para a prática do Marketing.
A informação é um insumo básico para a prática do marketing e para a gestão do conhecimento acerca do cliente em seus diversos estágios de interação com uma marca, produto ou serviço. Os dados obtidos através de ferramentas especializadas utilizadas em ações de marketing digital devem ser convertidos para informações relevantes que possam fundamentar a geração de conhecimento capaz de definir diretrizes para as ações de marketing, num ciclo constante de retroalimentação. O marketing está diretamente relacionado com questões de satisfação de necessidade e de desejo por parte de clientes. No atual cenário de atuação do marketing, a gestão do conhecimento passa a exercer papel fundamental. Um dos princípios básicos do marketing assenta-se na busca pela satisfação dos anseios e expectativas daqueles que irão consumir produtos e ou serviços através do atendimento às suas necessidades e desejos. Estes aspectos são tratados por outras áreas de conhecimento como o design, a psicologia e a semiótica, em que o foco seja o entendimento dos aspectos motivadores das ações do ser humano.
Um dos modelos lógicos mais utilizados para a compreensão do processo de satisfação do ser foi desenvolvido por Maslow (1943). Segundo o autor, as necessidades humanas são satisfeitas dentro de uma sequência determinada que se inicia com as necessidades fisiológicas e se complementa com as necessidades de auto realização, todas ocorrendo de forma cumulativa. De acordo com Maslow, o ser humano buscaria atender as necessidades na ordem de sua importância, partindo das básicas (inferiores) para as complexas (superiores), sempre no sentido de satisfazer primeiramente as inferiores e até alcançar as superiores, caminhando sempre no sentido de ampliar o grau de satisfação. Para o autor a necessidade é um aspecto inerente ao ser humano e um desequilíbrio no estado de satisfação irá gerar um desejo.
O marketing como um campo de aplicação tecnológica não tem a pretensão pela criação de necessidades, mas de desejos. Os desejos relacionam-se com a ausência de satisfação de necessidades específicas e que muitas vezes são despertadas pelo marketing através do uso de ferramentas singulares capazes de sutilizar a capacidade crítica do sujeito, levando-o a um estado de ambição e aspiração por um artefato, pela escolha por uma determinada marca. Sendo, este inclusive, o principal sentido de existência das marcas: cativar o sujeito para produtos ou serviços que possam satisfazer seus desejos e necessidades. Contemporaneamente, diversos autores defendem a importância de que a atuação do marketing como uma área de aplicação tecnológica deva se pautar por saber cada vez mais informações acerca dos clientes de uma determinada marca. Clancy & Krieg (2002, p.14) afirmam que as organizações mais bem-sucedidas atuam em função de dados e informações e as ações que são tomadas com base em intuição raramente remetem a resultados positivos. Ampliando os conceitos de Clancy & Krieg, percebe-se que mais do que perguntar o que os clientes desejam, é preciso saber, entender e até prever o que eles buscam, pensam, sentem e almejam como soluções para suas necessidades e desejos. Esta abordagem baseada na relevância tende a ser mais bem-sucedida para as organizações, uma vez que novos produtos e serviços passam a ser criados e concebidos com foco nas reais necessidades dos clientes.
Parte das dificuldades dos clientes em definir seus objetivos relativos à escolha de satisfação de um determinado desejo está relacionada à própria capacidade deles de expressarem seus anseios, sobretudo nos estágios iniciais, relativos aos processos de busca por conhecimento acerca das possibilidades de escolha. Um dos papéis do marketing é fazer uso de ferramentas que sejam capazes subsidiar este processo, facilitando as escolhas dos clientes, a partir do compartilhamento de informações relevantes para aqueles que ainda se encontrem em um estágio de buscas. E assim, posteriormente, realizar o oferecimento de soluções objetivas que visem satisfazer os critérios de seleção dos clientes. Para entregar satisfação para o cliente e entender melhor as suas necessidades Clancy & Krieg afirmam que é preciso encantar, deixando evidente a profunda relação existente entre o pré-conhecimento dos fatores que levam clientes a realizar determinada escolha e a satisfação entregue pela organização. Destarte, torna-se claro e evidente a necessidade de descobrir o que os clientes desejam. Contemporaneamente, os clientes fazem uso sobretudo, de ferramentas de busca na web (web search engines), frequentemente denominados, buscadores web, como por exemplo o Google, o Yahoo e o Bing, ou ainda diretamente nos sites das organizações, sejam elas, sites de conteúdo, lojas, fóruns ou em redes sociais para encontrar informações relevantes que possam lhes ajudar no processo de tomada de decisão de compra e escolha por uma determinada marca de produto ou serviço.
A relevância dos dados e informações coletados através de ações de marketing digital tornam-se cada vez mais preponderantes para as organizações e para as ações de marketing. Parte significativa do subsídio informacional que as áreas de marketing das organizações têm acesso, refere-se aos dados coletados dos usuários durante o seu percurso informacional em busca de informações para realizarem escolhas de produtos e serviços para consumo. Quer seja em buscadores web, quer seja diretamente, em websites, como lojas virtuais ou outros sistemas, o usuário, em termos práticos deixa para trás um rastro de dados acerca do seu comportamento de busca e de pesquisa que serão transformados em informações por softwares de análise de marketing e posteriormente em conhecimento acerca do cliente para a organização.
3 - A coleta de dados de usuários de websites (Tracking Data Collection) e as ferramentas de privacidade
A informação disponibilizada a partir da conversão de dados é de suma importância para a competitividade das empresas. Quanto mais se sabe sobre o cliente, maiores as chances de satisfação e maior o potencial competitivo da organização. De acordo com (CZINKOTA, 2001) manter um cliente é pelo menos cinco vezes mais barato do que adquirir um novo. Portanto, fica evidente a importância de conhecer o cliente e de se estabelecer relacionamentos duradouros, aumentando assim as chances de lucratividade a médio e longo prazo. De imediato surge o questionamento acerca de quais informações são mais relevantes para que as ações de marketing possam ser desempenhadas visando a estes objetivos. Outras questões relativas à forma de obtenção e o tipo de informação necessários são aspectos importantes. De acordo com Sveiby (1998, p.3) a gestão do conhecimento pode ser adotada como conceito pelas organizações como forma responder às demandas informacionais. Nas atividades desempenhadas pelo marketing, a gestão do conhecimento tem um papel de grande importância, uma vez que se constitui como um recurso fundamental para interpretar o cliente e seus anseios.
As organizações passaram a compreender a gestão do conhecimento como uma maneira de dar significação aos dados e informações para geração de conhecimento e assim transformá-los na sustentação para a tomada de decisões. O volume de dados e informações coletados pelas empresas torna-se cada vez maior e nas atividades do marketing não é diferente. Interpretar e analisar a informação no menor tempo possível tornou-se fundamental para que as ações praticadas sejam bem-sucedidas. Diversas soluções e ferramentas são utilizadas para coletar, analisar e contribuir para a tomada de decisões estratégicas por diretores e equipes de marketing. O marketing baseado no “feeling” deu lugar ao marketing baseado em dados e estatísticas, o marketing baseado na matemática das informações obtidas a partir da captura de dados de clientes em websites e sistemas on-line pautados em scripts de “traqueamento”, o tracking data collection. Aliado a este novo paradigma, uma nova forma de se relacionar com o cliente, o marketing de relacionamento, tornou-se frequente nas empresas fazendo surgir cargos e ocupações especializados em manter sites, blogs, fóruns, contas em redes sociais e toda forma de contato que possa dar ao cliente a sensação de aproximação e de relacionamento com a organização. Sem informação, a prática do marketing torna-se inconsistente e inviável. A informação tornou-se um insumo elementar para que analistas sejam capazes de entender o perfil dos clientes da organização. Um ciclo de absorção de conhecimento e geração de novos conhecimentos tornou-se evidente e a segmentação baseada em conhecimento assumiu importância extraordinária para as práticas do marketing. O marketing de relacionamento está pautado na premissa de uma administração organizacional que funciona orientada ao cliente (BRETZKE, 1992, 2000).
Os websites e plataformas digitais, em geral, fazem uso de scripts para realizar o tracking (rastreamento) das ações desempenhadas pelos usuários em suas páginas web e aplicativos. Desta forma, é possível, através da coleta de dados, verificar os interesses de busca, comportamentos e ações desempenhadas pelos usuários durante os tempos de interação ocorridos nos websites. Entre outros, este tracking tem por objetivo identificar e marcar as ações desempenhadas pelos usuários durante a navegação e assim entregar conteúdo relevante, na maioria das vezes, ações de marketing e campanhas publicitárias, além de ações de remarketing. Uma das formas deste processo ocorrer é através da colocação de cookies nos navegadores dos usuários. Cookies são arquivos que irão acompanhar o usuário durante o processo de navegação e interação com as páginas dos websites visitados, notificando atividades prévias do usuário. Portanto, os cookies são uma forma, dentre outras, de realizar o rastreamento e a aquisição de informações acerca do processo de navegação dos usuários de websites.
Segundo o site Ghostery Apps (https://apps.ghostery.com/pt-BR/apps/?p=1) existem mais de 2100 ferramentas capazes de realizar de alguma forma o rastreamento e a coleta de dados dos usuários de websites durante o seu tempo de permanência em páginas navegando ou interagindo. Somente a Google possui aproximadamente 20 “engines” (ferramentas de tracking) baseadas em scripts, capazes de coletar dados de usuários de seus serviços. Dentre as ferramentas da Google, destacam-se, por exemplo, scripts de coleta como os do:
- Adsense, um programa de afiliados em que blogs e sites publicam anúncios de outros sites que foram contratados na plataforma de publicidade da Google.
- Analytics, serviço utilizado para obter estatísticas de exibição de páginas, dados de visitação, demografia, dentre outros diversos dados de navegação de usuários que acessam websites que façam uso dos códigos de rastreamento associados ao serviço.
- Rede de Display, este serviço é composto por sites da própria empresa Google como por exemplo, o Gmail, o Youtube e o Bloguer, além de milhões de sites parceiros que alcançam um total de mais de 80% de todos os usuários da internet no mundo. A rede de display da Google veicula anúncios direcionados a públicos-alvo específicos.
Destacam-se ainda os serviços de diversas redes sociais que também fazem uso de scripts especializados na coleta de dados de acesso aos seus sites, segmentação de clientes e remarketing: Facebook, Instagram, Twitter, Pinterest, Tumblr, Flickr, entre outros. A figura 1 exibe um exemplo de dados estatísticos coletados pela ferramenta de análise do Google Analytics utilizado para gerar informações e base de conhecimento sobre as práticas de acesso de usuários em websites. Neste painel encontra-se um resumo de informações estatísticas coletadas de um determinado site. É possível, por exemplo, identificar dados como crescimento de tráfego, número de visitantes únicos, páginas visitadas, taxa de rejeição, tempo médio de permanência nos websites, novos visitantes, tipos de tráfego recebido pelo website, tipos de navegadores (browsers), origem geográfica dos visitantes, de acordo com um período de tempo pré-selecionado. Há ainda a possibilidade de coleta de diversos outros tipos de dados, como por exemplo, idade, sexo e interesses, tipo de dispositivo utilizado (computadores desktops, tablets ou aparelhos móveis); conteúdo mais bem sucedido, tipos de tráfego recebido em maior quantidade (orgânico ou pago), páginas de saída do website, tempo de permanência e tempo de desistência do usuário, número de cliques, redes sociais, e diversos tipos de dados capazes de ajudar analistas de marketing e gestores de conhecimento a tomarem decisões com base em perfis de acesso.
Figura 1: Google Analytics Dashboard (desenvolvida pelo autor)
Praticamente, todos os websites com a tecnologia de marketing embarcada fazem uso de algum tipo de ferramenta de coleta de dados de usuários e as utilizam em contrapartida para a entrega de conteúdo publicitário ou não de acordo com os padrões de navegação. A política de privacidade do Google, por exemplo, pode ser encontrada neste endereço https://www.google.com/intl/pt-BR/policies/privacy/. O primeiro parágrafo do conteúdo da página, nesta data, menciona: “Quando o usuário usa nossos serviços, confia a nós informações dele”. O objetivo deste artigo não é discutir os aspectos políticos, sociais ou éticos relativos à coleta de dados de usuários em websites ou plataformas digitais. Diversas políticas e normativas sobre o assunto veem sendo criadas e lançadas em países em que ocorra um maior grau de preocupação com os dados coletados de usuários pelas organizações. Por exemplo, em setembro de 2015, a Digital Advertising Aliance (http://www.aboutads.info/) lançou um guia para orientar a coleta de dados de usuários através de dispositivos móveis. Diversas outras ações têm sido empenhadas por governos, órgãos regulamentadores e organizações ao redor do mundo, preocupadas com a coleta de dados de usuários e o posterior uso destas informações. O foco deste artigo são os impactos das ações tomadas pelos próprios usuários através do uso de softwares, em sua maioria recursos adicionais (add-ons) instaláveis em navegadores capazes de incrementar novas funcionalidades aos browsers.
O fato é que grande parte dos modelos de negócios adotados por empresas on-line baseia-se de alguma forma na coleta de dados de usuários, seja para entrega de conteúdo orientado ao usuário, dentro das premissas do marketing orientado ao conteúdo, seja pelo uso destes dados coletados para criação de campanhas de marketing e remarketing com foco na entrega de publicidade direcionada de acordo com um perfil específico de público-alvo. Ou seja, de um modo ou de outro, as ações de marketing digital das empresas, atualmente, tornaram-se dependentes em grande parte da coleta de dados de usuários que navegam em sites e sistemas on-line. Para além da coleta de dados, há ainda que se considerar a própria veiculação de anúncios em websites que funciona como forma de monetização de diversos negócios on-line como blogs, websites de conteúdo e até mesmo redes sociais inteiras, como o Youtube e o Facebook, que têm boa parte de sua receita gerada a partir da veiculação de anúncios.
A captura de dados estatísticos de navegação convertidos em informações através de softwares como por exemplo, o Google Analytics permite às organizações e sobretudo aos especialistas em marketing a geração de conhecimento acerca do perfil dos usuários de seus websites. O marketing de relacionamento que vem sendo experimentado por diversas organizações e baseia-se em uma relação de aprendizagem constante sobre prospects, leads, costumers, promoters, fornecedores e outros entes relacionados ao processo. Portanto, para que a organização possa adquirir capacidade competitiva em relação à concorrência, é de grande importância a disponibilidade de informações acerca dos participantes de toda a cadeia do processo de marketing. De acordo com Kotler, “a capacidade de aprender mais rápido do que os concorrentes talvez seja nossa única arma competitiva duradoura”. Neste sentido, quanto maior o grau de interação entre o público de uma marca e a marca, propriamente, mais elevado torna-se o grau de entrega de serviços e produtos personalizados e que são acurados a cada novo ciclo interativo.
Grande parte das ferramentas utilizadas atualmente no tracker on-line de usuários busca associar o ambiente de coleta aos dados coletados. Torna-se de grande relevância para as ações de marketing identificar a origem do usuário, o seu tipo de dispositivo preferido, o navegador utilizado e até a sua posição geográfica. Esta última por exemplo, permite a configuração de ações (campanhas de anúncios, por exemplo) segmentadas e geolocalizadas, reduzindo os custos de investir em uma ação que ao contrário de atingir toda a camada de prospects, atua especificamente em uma localidade. As pesquisas de satisfação do cliente foram um primeiro nível de tentativa de obtenção de feedback por parte do cliente. Com o advento das novas tecnologias e ferramentas de monitoramento, um novo patamar foi alcançado. Parte significativa dos sistemas de coleta e análise de dados voltados ao marketing que até então apresentavam uma perspectiva pouco centrada no cognitivo do usuário, deu lugar a novas possibilidades, agora com foco no conhecimento acerca do cliente, ou seja, gerando conhecimento sobre o próprio cliente. As informações assimiladas têm importante relação com o passado informacional do indivíduo e possuem capacidade de gerar grande impacto nas ações futuras acerca das perspectivas e possibilidades de atuação no cenário em que a organização se encontra inserida. Fica evidente a importância da informação obtida pelo tracker on-line das ações dos usuários para as atividades desempenhadas pelo marketing e para a geração de conhecimento acerca do cliente.
4 - Ações, ferramentas e soluções contra o Tracking Data Collection
As novas possibilidades trazidas pelo alto grau de interação percebido pelos usuários a partir do uso de ferramentas e recursos disponíveis na web colocou-os em uma posição irrevogável no que se refere à capacidade de controle sobre o que consomem, seja na leitura de textos, na visualização de canais de vídeos ou de música, seja na participação em fóruns ou grupos e nas diversas atividades rotineiras de acesso ao conteúdo disponível na web. Os usuários estão se tornando capazes de controlar o conteúdo que consomem, inclusive no que se refere à publicidade on-line. Além disso, estão optando pelo uso de recursos capazes bloquear o traqueamento de suas ações on-line, como por exemplo: navegação anônima, navegação via proxxy, por VPN (virtual private network), deep web e aplicativos e soluções integradas em navegadores capazes de bloquear a coleta de dados estatísticos de suas atividades, o carregamento de propagandas e até a execução scripts específicos das páginas que visitam. As figuras 2 e 3 a seguir apresentam alguns exemplos de recursos utilizados pelos usuários de websites para bloquear propagandas e controlar o tráfego de dados coletado pelos websites que visitam. São denominadas neste artigo de ferramentas de privacidade.
Figura 2: Ad Block, AdBlock Plus e uBlock instalados no navegador Google Chrome (desenvolvida pelo autor)
Figura 3: App Ghostery instalado no navegador Firefox (desenvolvida pelo autor)
Diversos negócios on-line dependem e fazem uso significativo de anúncios e ações de marketing com base em propaganda veiculada em websites e sistemas on-line. Os sistemas de parcerias da Google para exibição de publicidade on-line são um exemplo. Muitos websites implementaram de modo descontrolado, o uso de anúncios, utilizando-os em excesso e até enganando o usuário com ações em botões (CTAs – call to action) que não correspondiam ao que era anunciado, levando-os a adquirirem vírus e outros arquivos, sem controle. O excesso de conteúdo deste tipo fez surgir em meados de 2006 os primeiros bloqueadores de anúncios através de pequenos aplicativos que podem ser instalados nos navegadores dos usuários. O assunto tornou-se polêmico e quase que diariamente alguma notícia é veiculada, algumas vezes envolvendo o nome de gigantes da internet, como Google, Amazon, Apple e Microsoft.
Entre os bloqueadores de anúncios, os mais conhecidos e famosos no ambiente on-line: adblock e adblock plus (figura 2). O Adblock foi criado por um desenvolvedor independente chamado Michael Gundlach, já o Adblock Plus foi criado por uma comunidade, baseado em código aberto (open source). Ambos funcionam nos navegadores Firefox e Google Chrome. Recentemente, o Adblock foi adquirido por uma empresa que ainda não se identificou até esta data. Uma das primeiras mudanças foi a utilização do sistema EyeO de “propagandas aceitáveis” como nova diretriz. Esta mudança de filosofia indicaria uma abertura por parte do software em permitir a veiculação de propagandas que não fossem consideradas abusivas pelo aplicativo. Rumores recentes também dão conta de que o plugin Adblock Plus estaria recebendo recursos financeiros de empresas como Google, Microsoft e Amazon para que seus anúncios fossem liberados. Estas ações já teriam tido impacto sobre a credibilidade destas ferramentas frente aos mais de 200 milhões usuários destes plugins. Diversos veículos de comunicação apontam também para o fato de que a Google e outras gigantes da internet estariam investindo no desenvolvimento de scripts que fossem capazes de neutralizar a presença de bloqueadores nos navegadores dos usuários. E uma espécie de guerra digital centrada no desenvolvimento de scripts que rodam diretamente nos sites estaria ocorrendo. Por um lado, os sites que tivessem os scripts de detecção de bloqueadores de propagandas poderiam, teoricamente, impedir que os usuários visualizem seu conteúdo; por outro lado, novas soluções capazes de impedir a detecção dos bloqueadores de propagandas pelos websites estariam sendo desenvolvidas.
Outras empresas decidiram tomar ações radicais de bloqueio de seu conteúdo àqueles que estivessem fazendo uso de bloqueadores. Um dos grandes nomes que encabeçaram o movimento foi o site da Forbes que decidiu bloquear o acesso ao seu conteúdo, daqueles que estivessem fazendo uso dos plugins de bloqueio como o Adblock e o Adblock Plus. Ao acessar o site da revista em http://www.forbes.com/, rapidamente, o usuário é redirecionado para o endereço eletrônico: http://www.forbes.com/forbes/welcome/ em que é convidado a desabilitar os softwares de bloqueio que esteja utilizado em seu navegador como se vê pela figura 4. A figura 3 mostra o mesmo site da Forbes acessível pelo uso de outra ferramenta de bloqueio de anúncios, o uBlock. Em teoria, os tradicionais bloqueadores de anúncios AdBlock e AdBlock Plus já estariam sendo detectados pelo script de detecção de bloqueadores como ocorreu no caso da Forbes. Mas o mesmo site não estaria imune à ação de outras ferramentas de bloqueio como no caso do uBlock que foi capaz de permitir o acesso ao site normalmente. Os testes foram realizados nos navegadores Google Chrome e Firefox Developer, ambos gratuitos.
Figura 4: Site da Forbes solicitando desativação do bloqueador de propagandas (desenvolvida pelo autor)
Outras ferramentas capazes de realizar o bloqueio de anúncios e outras modalidades de publicidade on-line são os plugins para Firefox e Google Chrome:
- Youtube Magic, capaz de reconfigurar toda a exibição de vídeos, inclusive ocultando recursos de publicidade do Youtube.
- UBlock Origin, capaz de bloquear propagandas e anúncios, avisar acerca da presença de rastreadores e scripts e permitir o by-pass nos sites com maior grau de sensibilidade aos bloqueadores tradicionais, como Adblock e Adblock Plus.
- NoScript para Firefox, capaz de realizar a gestão de scripts executados nos navegadores.
Na figura 5 é apresentado o plugin uBlock disponível para os navegadores Google Chrome e Firefox. Atualmente, ele tem sido o aplicativo embarcado instalável em navegadores com melhor desempenho na realização de bloqueio de anúncios em websites diante da relativa redução da capacidade de bloqueio recentemente observada nos tradicionais Adblock e AdBlock Plus.
Figura 5: Plugin uBlock para Google Chrome e Firefox (desenvolvida pelo autor)
Boa parte dos elementos dos websites é carregada através de recursos externos, como por exemplo, fontes tipográficas, bibliotecas de recursos visuais e inclusive, recursos de anúncios e coleta de dados dos usuários. Este carregamento é realizado por meio de scripts, comumente denominados de java scripts. O plugin para Firefox denominado NoScript possui a capacidade de identificar o carregamento scripts nos navegadores e controlar este processo de obtenção de dados, denominado de “cascata de dados”. Desta forma, o usuário é capaz de definir quais elementos deverão ser carregados nos websites visitados. Este procedimento, aplicado ao website da Forbes é que permite o controle do que deverá ser executado no navegador do usuário. Por exemplo, é possível, controlar e impedir o carregamento do script capaz de detectar a presença de bloqueadores de anúncios.
Na batalha dos bloqueadores de propaganda, rumores indicam que grandes empresas como a Google estariam financiando a criação de contra-scripts capazes de identificar a presença de bloqueadores de conteúdo de anúncios nos navegadores, como os plugins Adblok. Uma vez que os plugins são identificados, os usuários são convidados a desbloquear os anúncios (conforme a imagem 4 obtida do site da Forbes) sob pena de não conseguirem o acesso ao conteúdo. Há ainda notícias de outros grupos de usuários e comunidades desenvolvendo e evoluindo novos plugins capazes de burlar os scripts que detectam a presença de bloqueadores, como por exemplo o plugin uBlock Origin (figura 5), que é capaz, inclusive, de realizar o by-pass em sites que bloqueiam o conteúdo dos usuários, como no caso do site da Fortes.
Outras ferramentas, mais robustas, como o NoScript para Firefox ou o ScriptSafe para Google Chrome, que permitem ao usuário decidir qual script ele deseja que seja executado em seu navegador veem se tornando cada vez mais populares, embora sua utilização ainda seja mais comum entre os usuários considerados de nível avançado. Há ainda plugins capazes de identificar para o usuário todo os rastreadores presentes em um website visitado, como por exemplo, o Ghostery para Firefox. Além de identificar o rastreamento, o Ghostery tem a capacidade de realizar o bloqueio da coleta de dados do usuário por ferramentas e serviços estatísticos como o Google Analytics, plugins de redes sociais e mais de 1250 serviços de coletas de dados. Na mesma abordagem do plugin Ghostery, o plugin Disconnect para Chrome e Firefox atua explicitando os trackings realizados pelo website visitado, permitindo que o usuário realize o bloqueio de envio de informações para os sites para o qual não deseja fornecer dados de navegação. Segundo o website do desenvolvedor (https://disconnect.me/disconnect) até 17 % de banda poderiam ser economizados pelo uso da ferramenta e os websites chegariam a ser até 27% mais rápidos devido à ruptura no carregamento de anúncios e coleta de dados a partir de soluções de sites terceiros. Há ainda projetos que prometem impedir que os scripts criados para identificar a presença de bloqueadores de anúncios funcionem, como por exemplo, o projeto Anti-Adblock Killer | Reek disponível em: https://github.com/reek/anti-adblock-killer. O script promete manter o plugin Adblock ativo mesmo que um website solicite que ele seja desabilitado. Nos testes realizados, ele não conseguiu liberar o acesso ao site da Forbes.
A velocidade de carregamento do website é um dos argumentos mais fortes daqueles que defendem o uso de aplicativos capazes de controlar a exibição de anúncios e o rastreio de informações dos usuários, uma vez que o volume de conteúdo baixado para o navegador do usuário poderia ser reduzido e isto se converteria em ganho de performance. De acordo com alguns sites como por exemplo, o Liferacker (http://lifehacker.com/disconnect-2-speeds-up-the-web-protects-you-from-third-472942968), o carregamento de conteúdo de terceiros deixaria os sites mais rápidos e limpos visualmente. Como exemplo, pode-se observar que alguns desenvolvedores de sites optam por inserir uma imagem nos locais onde serão carregados os plugins sociais até que a página seja inteiramente carregada no navegador do usuário, para depois realizar o carregamento das partes relativas a sites de terceiros como Google, Facebook e outras redes sociais. Quanto ao aspecto da usabilidade, muitos defendem que a retirada de anúncios deixaria a navegação mais simples e intuitiva, já que a página estaria menos sobrecarregada visualmente reforçando o conceito de usabilidade limpa.
Para alguns, as soluções de controle de anúncios e de coleta de dados dão ao usuário o poder de escolha sobre o que ele deseja ver. Para outros, sobretudo, para as organizações, trata-se de um ambiente em que as perdas por rejeição de anúncios serão significativas, chegando a colocar em risco o próprio negócio. Pelas notícias veiculadas na mídia frequentemente, percebe-se forte movimentação das gigantes da comunicação digital na web afim de garantir a veiculação de seus anúncios. Também há mudanças de postura claras em função do surgimento das ferramentas de controle de conteúdo. Uma delas é o recente lançamento da plataforma Youtube Red, numa tentativa da Google de monetizar o serviço do Youtube. Há rumores sobre a perda de receita devido aos bloqueadores de anúncios que são muito eficientes no Youtube como se observa pela figura 8 em que é possível perceber a redução considerável da quantidade de anúncios na interface do buscador de vídeos.
Figura 6: Website do Youtube exibido com e sem o uso de bloqueadores de anúncios (desenvolvida pelo autor)
5 - Conclusão
É inegável a importância da disponibilidade de informações como um diferencial competitivo para as organizações. Para a atuação do marketing como uma tecnologia aplicada, a existência de informações acerca do cliente é indispensável. A geração de conhecimento acerca da base de clientes da organização é um ativo poderoso para que as ações de marketing desempenhadas pela organização possam caminhar no sentido de serem bem-sucedidas. O marketing digital evolui em grande parte fundamentando na disponibilidade de informação acerca do cliente, significativamente pela coleta de dados a partir de ferramentas e softwares desenvolvidos especificamente para a prática da gestão do conhecimento sobre o usuário de plataformas on-line, como websites.
Entregar conteúdos especializados e focados nas buscas dos usuários tornou-se comum e necessário nas práticas do marketing focado em conteúdo. Muitas destas atividades tornar-se-iam inviabilizadas na ausência de dados acerca do comportamento de busca dos clientes em sites como Google e Bing. Através destes dados, as empresas traçam um perfil informacional do usuário e ações de marketing com base no interesse de busca destes usuários emergem para atender às suas demandas. Então, pergunta-se: porque num ciclo em que o usuário diz o que deseja e as organizações entregam conteúdo, produtos e serviços de acordo com esta demanda, ocorre a adoção de ferramentas de bloqueio e controle de privacidade por partes dos próprios usuários de websites, impedindo assim a obtenção de dados estatísticos sobre suas condutas e a redução da exibição de conteúdo de anunciantes?
O fato é que os usuários, sobretudo, aqueles com maior grau de conhecimento e contato com a tecnologia sempre irão buscar alternativas para navegar em websites dentro dos princípios e parâmetros que eles próprios considerem aceitáveis. Por exemplo, a exibição de um vídeo no youtube enseja em média 1 anúncio a cada 10 minutos em média, podendo chegar a 15 exibições em 1 hora de vídeo, enquanto que nos canais da televisão aberta este número cai para 4 propagandas em 1 hora, podendo chegar a 6, pergunta-se: o excesso de entrega de conteúdo de anunciantes poderia causar a conduta de bloqueio por parte dos usuários?
Várias ferramentas surgiram com o passar dos anos e permitiram que o usuário pudesse saber o que estava acontecendo nos bastidores. Estas aplicações continuarão a surgir e a controversa disputa pela exibição de anúncios ainda ensejará muitos capítulos. As organizações e o marketing terão que buscar alternativas cada vez mais arrojadas e tecnologicamente mais bem desenvolvidas para suplantar os bloqueios de privacidade executados pelos usuários. Haverá uma tendência de redução de conteúdo na forma de anúncios? Caminhamos para o marketing responsável, de fato? As perdas de receitas por questões de bloqueio de anunciantes ainda serão assunto a ser discutido largamente nos próximos anos.
Uma postura interessante talvez fosse o diálogo com o próprio usuário que demonstra estar desejoso de novas formas de contato com as marcas através de ações de marketing digital menos invasivas. Os excessos deverão ser combatidos, novas políticas de uso e controle de conteúdo de anunciantes deverão surgir nos próximos anos a exemplo do que já ocorre em países como os EUA. O impacto causado pela redução da disponibilidade de dados para as ações de marketing é significativo e gera por consequência, redução da capacidade das organizações de se alimentarem de dados acerca de seus clientes, impactando assim, na gestão de conhecimento sobre o cliente.
Novas formas de obtenção de dados estatísticos das ações dos clientes em websites e sistema de busca deverão surgir nos próximos anos. Acredita-se que exista uma corrente que buscará reforçar ainda mais a forma de coleta de dados dos usuários tornando ainda mais difícil a rejeição destes aos mecanismos de tracking; por outro lado, haverá uma corrente que acredita que novas abordagens e funcionalidades de controle estarão disponíveis em navegadores para permitir aos usuários ter maior comando sobre o que veem, consomem e entregam às organizações, o que por consequência irá requerer das empresas um estreitamento do diálogo com o seu público-alvo com base em ações menos desgastantes.
As questões relativas envolvidas nos processos de veiculação de anúncios são delicadas e as receitas perdidas são gigantescas. Grandes nomes do ambiente digital estão em disputa para impor suas ideologias. Recentemente, a Apple anunciou a possibilidade de bloqueio de anúncios em seu navegador a partir da próxima atualização do sistema operacional IOS. Rapidamente, a Google divulgou em seu blog para desenvolvedores de websites, que haveria uma forma de contornar os bloqueios. Além da questão ideológica, questões financeiras relevantes para diversas organizações, sobretudo aquelas dependentes de anúncios e de dados coletados de usuários, como por exemplo, a Google, são de extrema complexidade e causadoras de preocupação.
O usuário, num primeiro momento, com o surgimento da televisão, encontrava-se em uma posição ainda, unidimensional, por assim dizer. Um usuário que estava diante da “caixa” recebendo informações e não possuía condições de determinar o que seria enviado para ele, a não ser que ele se levantasse do sofá e trocasse de canal. Com o surgimento do controle remoto, pode-se dizer que o usuário passou para uma posição bidimensional em que o controle passou a circular nas duas direções. O usuário passa a ter a capacidade de escolha do que ele iria consumir, ainda que de forma pouco arrojada. Com o advento da web e das novas tecnologias, pode-se dizer que o usuário entrou em uma dimensão tridimensional onde ele passa a ter um controle parcial do que vê, embora ainda esteja sob o impacto de anúncios e demais exposições comuns no ambiente virtual. De certo modo, ele escolhe o que consumir e define o que entrega de volta.
O controle à coleta de dados dos usuários é uma realidade e tende a tornar-se cada vez mais conhecido e reconhecido por parte dos usuários. Novas modalidades de marketing baseado na coleta de dados deverão surgir e a gestão do conhecimento do cliente deverá buscar adaptar-se a esta nova realidade em que o usuário passará a estar em uma condição ativa diante das tecnologias à sua disposição.
Muitas questões continuam em aberto e a área de coleta de dados digitais, bem como as novas posturas dos usuários frente a estas ações ainda são recentes e ensejaram muitos estudos sobre o impacto das mudanças no relacionamento entre organizações e clientes. A gestão do conhecimento acerca do cliente, relacionada ao marketing vem tornando-se em grande parte dependente de novas formas de obtenção de dados e de análise do conhecimento adquirido sobre o cliente. Os impactos de adoção de ferramentas que impeçam ou reduzam significativamente coletar dados sobre os clientes e gerar conhecimento sobre eles é um campo de estudos aberto e poderá ser muito frutífero nos próximos anos.
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